Elmar Wepper e Hanellore Elsner |
Não arrependi-me sequer por um segundo, a produção correspondia ao cartaz tão delicado e deixava a sinopse, mais uma vez, "anos luz" da sua real dimensão.
Logo no início da trama compartilhamos com Trudi (Hanellore Elsner) de uma informação secretíssima, seu marido Rudi (Elmar Wepper) tem uma doença terminal, terá poucos meses de vida. Os médicos sugerem que Trudi seja cuidadosa ao fazer tal revelação ao marido e ainda aconselham-na a viver da maneira mais prazerosa possível os dias que lhes restam juntos. Abalada, Trudi convence seu marido a fazerem uma viagem, primeiro para Berlim, onde dois dos filhos do casal moram e depois para o litoral. Na capital alemã, o casal de idosos não é tão bem recebido quanto poderíam esperar. Os filhos e netos com suas pertubações e atividades cotidianas dispensam pouca atenção aos dois, requisitam uma rapidez de ações e pensamentos que a idade limita e uma compreensão que ainda esta longe da realidade do casal interiorano. A simples hospedagem transforma-se em um fardo para os filhos. E aí, a sensibilidade da obra, a possibilidade do espectador se colocar no lugar do casal de terceira idade. Mais uma vez, o poderoso cinema nos aproxima de um dilema tão real, tão atual. Aos poucos, a minha empatia pelo casal é crescente. Enquanto divido um biscoito salgado recheado de tomate, com a amiga, as primeiras lágrimas começam a rolar. Trudi e Rudi um casal de meia idade solitários, magoados seguem para o litoral, para a última viagem que fariam juntos. Depois de passarem uma noite no hotel, Rudi, o marido, acorda, abre as cortinas, aguarda alguns minutos, que a mulher desperte, até se aproximar dela e perceber que sua esposa havia morrido. A morte estava decretada para Rudi, mas é Trudi que parte e deixa o marido completamente perdido.
Segue-se a despedida dolorida de Trudi e depois uma tentativa desesperada de Rudi voltar ao seu cotidiano. Mas, depois de anos de matrimônio, de uma esposa que facilitava todas as atividades do marido, ele percebe que sem Trudi não há cotidiano possível. Ao mexer em algumas lembranças de Trudi, Rudi confronta-se com a paixão da sua mulher pelo Butô, uma dança típica oriental, que tantas vezes o próprio Rudi questionou, porque lhe parecia tão exótico. Perdido, o homem encontra no desejo de sua mulher, uma forma de manter-se próximo a ela. E de certa forma, desculpar-se com ela por anos de anulação dos seus próprios sonhos para correponder às expectativas dos filhos e do marido. Decidido, segue até o Japão, onde o terceiro filho do casal mora, para conhecer o Monte Fuji, sonho de sua mulher, e aprender o Butô.
O terceiro filho, assim como os outros dois de Berlim, reage com total desprezo e impaciência com a inesperada visita do pai. O agravante aqui é o visitante estar em um local geografica e culturalmente tão diverso do seu habitual. É possível compreendermos a sensação de deslocamento e inadequação que Rudi sofre. Na capital japonesa vemos um homem determinado a realizar os desejos secretos de sua mulher; ele assiste ao "hanami" festival que ocorre uma vez por ano, quando as típicas cerejeiras no japão estão em flor. Em uma praça pública conhece uma jovem artista de butô, que o ensina alguns fundamentos e, finalmente, segue com ela até o Monte Fuji.
Na viagem de Rudi, Trudi é a mais importante. É uma viagem de despedida de um amor, um casal, uma vida inteira em comum. É a redenção de Rudi, sempre tão seguro e previsível, se arriscando para realizar o sonho de sua amada Trudi, é o retrato da vida moderna requisitando cotidiano, rejeitando o antigo. As cerejeiras em flor é um simbolismo bastante oportuno para o que vemos na tela, a vida belíssima, brilhante, colorida e efêmera. Tudo passa, o filme, as flores na cerejeira, o biscoito recheado com tomates secos, a tarde ociosa, a companhia descomprometida e, finalmente, a vida. Saio da sala com os olhos marejados, mas confortada pela poesia na tela. Olhe para fora, as cerejeiras estão em flor, em todo lugar, apontando para a efemeridade que é esta vida.
"Hanami - Cerejeiras em Flor" (Alemanha/ França - 2008)
Direção: Doris Dorrie
Roteiro: Doris Dorrie
Duração:127 min
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