Sucesso de público

segunda-feira, 11 de fevereiro de 2013

Escolha o seu lado - Sobre "O lado bom da vida"

Bradley Cooper
  
  No jornal local as sinopses dos filmes em cartaz não são nada confiáveis, mas ele é, ainda, a minha maior fonte de "consulta" sobre o assunto, porque a informação quanto ao horário das sessões é, até hoje, preciso. E é tudo o que eu realmente desejo saber sobre um filme antes de vê-lo. 
  
  O gênero, de acordo com a publicação, é comédia romântica, disso também desconfio, só no último mês, dois dos filmes que vi, não correspondiam ao gênero anunciado na coluna. Que seja, gosto de surpresas. A companhia para o programa também não podia ser melhor, assistiu o filme duas vezes, em casa, e quase nada me revela sobre ele. Ela gostou, possivelmente eu também goste. Não sou exigente e gosto, sem medo algum de admitir, muitíssimo de comédias românticas (não julguem-me por isto!). Não preciso justificar meus gostos, tampouco este até bem comum, mas ainda assim o faço: afora as análises muito rígidas sobre tal estilo de filme "mulheres gostam porque este gênero de película repetem os modelos dos contos de fadas infantis, em que um 'príncipe encantado' surge para salvar a mocinha de um mundo de infortúnios"; carrego comigo a crença de que as comédias românticas são o bálsamo em meio a uma vida de dureza, obrigações massantes e uma realidade cruel, imperfeita e permeada de desencontros. Tal gênero, a mim, possibilita algumas horas de uma respiração descomprometida fora do meio, tantas vezes, sufocante, que é a vida cotidiana. Happy ends cinematográficos são a visão, ainda que perecível, de uma paisagem otimista. O filme, no entanto, adianto para quem não viu, não é uma comédia romântica e sim dramática. Neste caso, a informação imprecisa não comprometeu. A mim, fez um "efeito" de comédia romântica, com os impactos que acabei de listar.

  "O lado bom da vida", é uma adaptação do primeiro romance do professor de inglês Matthew Quick. O filme, sucesso de público (indicado a oito categorias do prêmio Oscar de 2013) conta a estória de Pat Solitano (Bradley Cooper) e se passa em um típico subúrbio americano. Inicia-se com a saída dele de um hospital psiquiátrico, ainda que não recomendada pelos médicos, mas autorizada e muito desejada pela sua mãe. Pat, diagnosticado com bipolaridade, precisa se adaptar a um nova vida, repleta de limitações: sem esposa, de quem está judicialmente proibido de aproximar-se; sem emprego e sem a própria casa, além , é claro, da rotina enfadonha do próprio tratamento, com visitas ao terapeuta e medicação controlada. O retorno de Pat ao convívio social, é dos mais comoventes, o "otimismo químico", a falsa sensação de retomada do tempo perdido, a emoção da família em vê-lo de novo, o desconforto dos amigos que não o visitaram e as suas desculpas tão pouco verídicas, tudo está lá. 

  Obcecado pelo retorno da "vida anterior", pela mulher, a qual torna-se a grande meta e objetivo de "cura" e evolução, Pat nos rouba o coração, sensibiliza e nos força a algum tipo de identificação. Seja pela fragilidade (no seu caso a doença psíquica), pelos momentos de euforia intercalados com depressão e fúria, seja pela vontade genuína de ser melhor para alguém. Aos poucos somos apresentados à família, amigos e, finalmente, à dinâmica a qual Pat precisa se adaptar: a mãe amorosa, abnegada e excessivamente zelosa; ao pai jogador compulsivo, rígido, claramente afetado pelo TOC, ao irmão tosco, não suavizado por qualquer verniz de sofisticação ou delicadeza, ao melhor amigo, cheio de boas intenções, mas completamente controlado pela mulher. Pat receberá ainda as visitas do amigo da clínica, em fuga, frequentemente, e conhecerá Tiffany (Jennifer Lawrence), com quem veremos aflorar uma relação conturbada, mas, ao mesmo tempo, delicada, enriquecedora e repleta de entendimento mútuo.

  Pat e Tiffany, aos poucos formarão um casal,  bem pouco convencional, é verdade, mas muito promissor. Pois ambos são a doença e a cura; o que impede e o que impulsiona; são a loucura e a sanidade; agressividade e sutileza; são ódio e amor, tudo junto, ao mesmo tempo e aprendem um com o outro a dinâmica de uma relação muito própria. À certa altura do filme, compreendemos que os sonhos de Pat Solitano não são passíveis de realização e o passado de Tiffany não poderá ser apagado, mas isto nem ela mesma deseja, quando diz a frase emblemática: "eu tenho um lado sujo e gosto dele também" e Pat descobrirá outras metas, outros sonhos, outros motivos para desejar melhorar.

Não sei se pela sensação de comédia romântica, não sei se pela dança (que adoro) - Tiffany e Pat participam de uma competição - não sei se pela trilha sonora  pouco convencional, com destaque para "Girl from de North country", de Dylan e Cash, pela interpreyação de Robert De Niro, com quem sempre me emociono  ou mesmo pelo tema, mas "O lado bom da vida" conquistou meu coração.

  O filme nos faz pensar que, amar, é também entrar na loucura de quem se ama, para só assim ser possível tirá-lo de lá. Amar, inclusive, é respeitar e nunca temer a loucura alheia, nem a própria. Que o sucesso da última dança não consiste em dançar um único estilo com perfeição, mas somente o suficiente de uma variedade maior de estilos. Em um mundo cada vez mais exigente, mais apegado à perfeição, ser razoável talvez seja a maior fonte de felicidade. O lado bom é muito mais o olhar que ofertamos para cada situação, do que a situação em si. Nisto o filme não é nem um pouco trivial. Meu coração ele já tem e, só por isto, eu já daria o Oscar para ele. Porque, para meu entendimento, eis a maior propósito do cinema: emocionar. A mim, por estas e outras infinidades de razões que jamais poderei explicar, o filme tocou.


O Filme: "O lado bom da vida" (EUA, 2013)
Diretor: David O. Russel
Duração: 122 min.

O Livro: "O lado bom da vida"
Autor: Matthew Quick
N° de páginas:256



5 comentários:

  1. "O lado bom" também conquistou meu coração... percebe-se, ne?! ;) E, depois dessa leitura sensível da cena de dança, acho que vou ve-lo novamente só pra não sentir vergonha e lembrar de Peq. Miss Sunshine... rs!!!

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  2. Amanda, acho que sou o único que não foi tocado pelo filme a ponto de considerá-lo merecedor dos prêmios aos quais está indicado, antes de escrever sobre ele, resolvi dar uma segunda chance e a minha reação foi a mesma. Eu me envolvi com a história e fui cativado por ela, contudo continua achando a história superficial, apesar de eu sentir que ela tenta não sê-lo, acho reducionista a forma com que ela retratou o transtorno bipolar e, ao contrário de todos, achei a atuação do Bradley Cooper um tanto forçada...

    Apesar do David O. Russel ter uma personalidade afetada, gosto de seus filmes, defendi com umas e dentes "O Vencedor", que foi na minha opinião um dos melhores filmes de 2010 e tenho uma enorme simpatia pela Jennifer Lawrence (acho sobrenatural a atuação dela em "O Inverno da Alma"). Eu queria ter gostado mais do filme, mas infelizmente não consegui ver nele nada que seja de fato extraordinário...

    Ontem assisti "As Sessões", este sim me tocou e muito, meus olhos ficaram mareados durante boa parte do filme, ele retratou o drama do personagem central de uma forma sutil, sem apelações, e ainda que haja alguns lugares comuns em sua trama, ela não nos aparenta ser falsa ou exagerada em nenhum momento. Ele é mais um dos que eu gostaria que tivesse sido indicado ao Oscar de Melhor Filme, Ator e Roteiro Adaptado no lugar de "O Lado Bom da Vida"...

    Ótimo restinho de feriado pra ti querida!

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  3. Não mesmo J. Bruno, você não foi o único, li algumas resenhas que estão bem afinadas com as suas opiniões. O caso acho que é bem subjetivo mesmo, como disse aqui, por algum motivo o filme me cativou. Não achei Bradley e Jennifer sensacionais, mas gostei da atuação de ambos, até mais da dela. O caso da bipolaridade de Pat, por exemplo, na minha visão, não era o assunto mais importante (por isso não aprofundado), mas sim o fato de que "de perto ninguém é normal" e aprender a conviver/aceitar nossas grandes e pequenas loucuras diárias talvez seja o nosso maior desafio.

    No mais, concordo contigo o filme não é nada extraordinário, taí uma identificação: o ordinário quase sempre me ganha!rs
    Assistirei este que recomendou-me, se gostar, faço um textinho, se não, esqueço e parto pra outra!rs ;)
    Beijo, obrigada pela participação sempre excelente!

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  4. Pra mim o que fica do filme é mesmo a insconstância humana, ou melhor, nem de perto nem o tempo todo somos normais. Só não concordei com o Oscar dado a Jenifer Lawrence... acho que nem ela concordou... aquele tombo tem um quê de insconsciente!

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    1. Ah...mas é aquela coisa: prêmios não dizem tanto a respeito de um trabalho, principalmente, em uma arte tão subjetiva. Uma coisa é o que "eles" pensam e outra é o que de fato ficará. Emmanuelle Riva e sua Anne foram capazes de me modificar e isto sim deve falar alto a uma atriz, não é? ;)

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Então...