Sucesso de público

quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

Não mirem-se nas mulheres de Atenas - Sobre "E agora, aonde vamos?"

  
  Mulheres em luto, vestidas de preto, algumas com lenços cobrindo a cabeça, semblantes pesados, faces austeras, como as viúvas personagens de Garcia Lorca . Os corpos em um monótono balanço, em uma coreografia fúnebre e dramática, é assim que a narrativa de "E agora, aonde vamos?" inicia-se. A comédia dramática tem a sensível direção de Nadine Labaki (também protagonista), premiada pelo igualmente delicado "Caramelo" (2007), um outro filme também feminino, não só pelo fato das protagonistas serem mulheres, mas, mais ainda, pela perspectiva muito peculiar sobre assuntos tão universais. 

  Em "E agora, aonde vamos"(2012), a guerra civil é tratada sob o olhar afetuoso e comovente de mulheres que perderam seus homens (maridos, filhos, irmãos) para um conflito injustificável. Em uma cidadela no interior do Líbano, cercada por minas terrestres, com difícil acesso e entretenimento restrito, mulheres com "M" maiúsculo tentam apaziguar os ânimos dos homens da aldeia, mais propensos a estourarem do que as próprias minas. Os Cristãos e  os muçulmanos, vizinhos, em um primeiro olhar, parecem conviver  pacificamente, em um ambiente de respeito e fraternidade mútua. No entanto, a narrativa ora com ares de fábula, permeados pelos pequenos números musicados, ora em estilo de anedota, com as cômicas estratégias elaboradas pelas mulheres, aos poucos revela que, na verdade, um conflito brutal está sempre iminente, poderá acontecer a qualquer momento, pelo menor motivo. Cabe então, às mulheres, tanto católicas, quanto muçulmanas unirem-se para que qualquer conflito, senão completamente extinto, permaneça, pelo menos, adormecido.

  O surpreendente convívio com as sensuais dançarinas ucranianas que chegam ao vilarejo, dão o tom da comédia na obra, as visíveis diferenças culturais, demarcam o quanto o feminino é diverso em um mesmo mundo, embora costumeiramente sejam tratadas como uma "única espécie". Assistimos também a aproximação comovente de mulheres culturalmente distantes: muçulmanas, cristãs e as urbanas ucranianas, todas se solidarizam e se envolvem no mirabolante plano de redenção da paz na comunidade.

  Por outro lado, a dor é retratada também de maneira pungente, no drama da mãe que esconde a morte do próprio filho para evitar o início de um conflito generalizado. Ela recolhe sua dor, afasta a revolta em nome de uma tentativa de manter os outros filhos vivos, assim como os filhos de outras mães. 

  A narrativa não é das mais perfeitas, a obra tem lá suas falhas, mas é otimista, é elogiosa, não somente às mulheres, mas, principalmente, ao feminino. A maneira, ao olhar, as soluções atribuídas ao gênero. O final é bastante fantasioso, mas aponta um caminho possível; o da empatia com aquilo que parece ser diverso. Pensem nas mulheres de Atenas, que Chico cantou:" (...)As jovens viúvas marcadas/ E as gestantes abandonadas/ Não fazem cenas/Vestem-se de negro, se encolhem/Se conformam e se recolhem/Às suas novenas/ Serenas", em comum, só o negro das roupas, porque em "E agora, aonde vamos?" as mulheres nunca se encolhem, conformam ou recolhem, elas vão à luta, a sua maneira, mas vão.


"E agora, aonde vamos? (França/ Líbano, 2012)
Direção: Nadine Labaki
Duração: 110 min.



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