Sucesso de público

terça-feira, 5 de fevereiro de 2013

Sonhos que movem - Sobre "os Miseráveis"

Anne Hathaway

 Como recontar uma estória escrita há mais de um século (1862), já  com dezenas de adaptações para o cinema, televisão e teatro e ainda assim despertar um crescente interesse do público contemporâneo, aparentemente cada vez mais ávido por novidade? Como a adaptação de uma adaptação (o filme é a adaptação,  do musical da Broadway "Les Misérables", de 1987, adaptada da obra de Victor Hugo) pode ser tão bem sucedida entre o público e crítica e ganhar novos fãs a cada dia? Como um musical, com duração de quase três horas, pode "aprisionar" até um espectador pouco simpático aos musicais, na cadeira do cinema? Como em uma única fita abordar temas, aparentemente tão diversos, como: injustiça, perdão, redenção, fé, ideologia, política, amor romântico e, ainda assim, dar conta de todos eles, sem "atropelar" o espectador?

  O sucesso de "Os miseráveis"(2013), parece-me ser a linha discreta, porém visível, que alinhava a emocinante saga de Jean Valjean, condenado a uma dura pena por roubar um pão para alimentar o sobrinho faminto, que encontrará sua redenção no amor fraterno de um religioso que possibilita uma nova chance ao homem injustiçado. A linha que costura as estórias do filme (o recomeço de Jean Valjean, a obstinação do inspetor Javert em prender o "fugitivo" Valjean, o triste destino de Fantine, a adoção de Cosette, a ambição sem limites dos Thénardier, o amor não correspondido de Éponine por Marius, a revolução francesa, a reciprocidade de afeto entre Cosette e Marius e, finalmente, o desprendimento de Jean Valjean, para que a filha conhecesse a felicidade) é a, algumas vezes trágica, mas sempre propulsora linha chamada, sonho. Em " Os Miseráveis" todas as personagens são conduzidas e, mais, impulsionadas, pelos próprios sonhos. Seja de maneira mais individual (Fantine que sonha em ter por perto a filha Cosette) sejam aqueles mais coletivos (como os ideais dos revolucionários franceses), todos lutam por algum sonho. Alguns caírão durante a dura batalha, outros poucos permanecerão de pé, mas todos experimentarão a força que move a humanidade - o sonho. 

  E, é exatamente através desta "linha" que um dos musicais mais emocionantes do filme será conduzido, a cena de Fantine (a incrível  e afinadíssima Anne Hathaway) cantando um dos temas mais bonitos de todos os tempos, a linda "I Dreamed a Drem") é tocante. Para quem conheceu-a na voz da até então desconhecida e estranha caloura do famoso show de talentos inglês, Susan Boyle, há anos atrás, talvez emocione-se ainda mais. Porque a memória subjetiva trará à superfície, a história também triste de uma personagem real, cujo sonho torna-se motivo de vergonha, juntamente com a personagem de Victor Hugo, que tem seus sonhos despedaçados, ambas, por um momento, dividem  a mesma perspectiva. É como se Susan e Fantine carregassem um pouco de nós em cada desilusão, cada triste derrocada e nós as trouxéssemos conosco em cada sonho nosso, ainda possível.  Por apenas uma linha tênue o fracasso e o sucesso, de um lindo sonho, estão separados.

  Emocionante também é a estória de Éponine, personagem cujos modelos familiares negativos não são capazes de torná-la egoísta ou má. A filha dos Thénardier não mede esforços para ver seu amado feliz, ainda que isto signifique estar ao lado de alguém que não ela. Este amor abnegado também é virtude de Valjean que mesmo desejando a companhia de sua amada filha Cosette, decide deixá-la viver seu amor com Marius, protejendo-a de seu passado obscuro.

  Suspeito que poucos são os que não se emocionarão. Terminado o filme, saímos do cinema com a forte sensação de que miseráveis mesmo são os que nunca sonham, que nem ao menos têm a possibilidade de verem seus sonhos despedaçados. Miseráveis são os que não deixam-se impulsionar por um grande sonho.  Existe maior pobreza que falta de sonho?


Em tempo: Lembrar-se de Susan Boyle ao assistir ao filme não é uma simples "brincadeira do destino". Li isto, ontem:  http://caras.uol.com.br/data/oscar-2013/post/susan-boyle-motivou-a-adaptacao-de-os-miseraveis-para-o-cinema-diz-produtor-teatral#image0

"Os miseráveis" (Reino Unido, 2013)
Direção:Tom Hooper
Duração: 158 min.




3 comentários:

  1. Concordo Mandinha... nd mais miserável que não, ao menos, sonhar!!! E, definitivamente, a interpretação de Fantine (Anne H.) foi o que mais me emocionou e confesso que chorei um bocado... ;)
    PS: Agora to esperta em qual blog to comentando!!! rs...

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    1. Chorei muito com a Fantine também, Rafa! Haha ficou espertinha...e já sabe qual é qual...mas, sua participação, independente de saber em qual comenta, é sempre ótima! Amanhã tem aquele outro lá, né?Beijo ;)

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  2. Amanda, achei excelente a sua análise, de fato o sonho é o que movo todos os personagens, até mesmo o Javert. Eu também acho a história da Éponine uma das mais interessantes e emocionantes!

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